sábado, 27 de fevereiro de 2010

Exobiologia - Alienígenas humanóides e a evolução da ciência no âmbito extraterrestre


As mudanças de conceitos e quebra de paradigmas durante algumas décadas


Via Láctea: um grão de areia no deserto, ou numa praia movimentada e repleta de vida?
Embora outras idéias não tenham jamais deixado de ser consideradas, até poucas décadas a hipótese da formação de nosso sistema solar por meio de um acidente cósmico raro, como uma quase-colisão entre estrelas, era a preferida pelo mundo científico. Pessoalmente, este autor ainda lembra-se de ter sido esta a única explicação que lhe foi ensinada, lá atrás, ainda no que hoje chamamos de primeiro grau [atual Ensino Fundamental]. Se realmente fosse tal fenômeno a origem do nosso mundo e de seus companheiros que gravitam ao redor do Sol, então a própria existência de planetas seria extremamente rara, e haveria uma boa possibilidade da Terra ser realmente um dos pouquíssimos pontos do universo onde a vida poderia existir.
Contudo, os avanços da astronomia e da astrofísica nos últimos anos tornaram possível a detecção, por diversos métodos, de vários planetas girando ao redor de outras estrelas em nosso entorno galático. Parece agora que o surgimento de planetas é a norma durante a formação dos sistemas estelares, ao invés de uma exceção e, como conseqüência, nossa galáxia – por extensão, todo o cosmos – é imaginada atualmente como estando coalhada de planetas dos mais diversos tipos e tamanhos. Não existem motivos para se imaginar que pelo menos uma pequena proporção dos mesmos não seja capaz de abrigar a vida. Como existem centenas de bilhões de sistemas estelares apenas em nossa galáxia, mesmo que apenas uma em cada milhão de estrelas fosse acompanhada por um planeta contendo formas de vida, ainda assim haveria centenas de milhares de mundos vivos espalhados pela Via Láctea. Por isso, a ciência atual considera ínfima a possibilidade de que nosso planeta seja o único ponto onde a vida se desenvolveu, inclusive pela característica marcante da própria: sua tendência à evolução, sob formas cada vez mais complexas em sua adaptação aos desafios do meio ambiente. É muito provável que a vida tenha avançado para formas inteligentes em diversificados ambientes e planetas, capazes de construir uma civilização.
Esse fato levanta a interessante questão de como poderiam ser estas criaturas inteligentes, evoluídas em outros mundos. Infelizmente, não temos atualmente nenhuma informação sobre como a existência poderia ter se desenvolvido em orbes diferentes da Terra e somos forçados a utilizar apenas o conhecimento que temos sobre a vida em nosso próprio habitat para tentar imaginar como se pareceriam os habitantes de outros sistemas estelares. De um modo geral, a maioria das pessoas aparenta imaginar que seres inteligentes extraterrestres seriam variações de nossa própria forma humanóide, com apenas alguns detalhes diferentes e, para verificar este fato, basta observar as descrições de alienígenas apresentadas nas histórias de ficção científica e nos relatos, não importa se reais ou não, de contatos com ocupantes de discos voadores. Será, contudo, que baseando-nos nos conhecimentos que possuímos sobre a biologia terrestre podemos mesmo deduzir que eventuais civilizações existentes em outros astros sejam formadas por pequenos homenzinhos cinzentos de olhos grandes, guerreiros com cascos de tartaruga na testa ou qualquer outra raça que poderia sem maiores problemas vestir uma calça jeans? O que já sabemos sobre o desenvolvimento da vida aqui na Terra que possa nos dar uma idéia do que esperar em outros mundos pelo universo? Sem entrar na complexa discussão sobre a origem da vida em si, neste artigo vamos verificar quais seriam os requisitos para que criaturas alienígenas pudessem adquirir um nível de inteligência comparável ao nosso, a ponto de poder formar uma civilização.
Vida e evolução - 
O primeiro ponto diz respeito à própria definição de vida. Apesar de não parecer, é muito difícil definir o que seja e ainda não existe uma definição universalmente aceita. Isso porque existem no mundo microscópico organismos que estão no limite entre a vida e a matéria inanimada, como os vírus e os príons, e não é muito fácil criar uma classificação que possa incluí-los juntamente com as formas animais e vegetais macroscópicas com as quais estamos mais familiarizados e que estão, com certeza, dentro dos padrões do que chamamos de “vivos”. Para o tema em discussão neste artigo, podemos em princípio ignorar estas formas limítrofes, pois não há como imaginar que possam, por si mesmas, criar uma civilização, que é o que nos interessa no momento. Assim, podemos adotar o conceito de que a vida é definida como sendo aquilo que pode interagir de forma ativa com o meio, retirando dele elementos para sua sustentação, crescimento ou procriação, e possuindo ainda a capacidade de auto-organização interna. Esta definição é bastante ampla para englobar entidades que possam ser bastante diferentes do estereótipo reconhecido aqui na Terra.
Contudo, considerando que a criação de uma civilização exige que as formas de vida em estudo não apenas sobrevivam, mas sejam também capazes de alterar, deliberadamente, o meio em que vivem, seres muito simples como bactérias e protozoários estariam fora do escopo de nossas elucubrações. Outras formas de vida são imagináveis, como a estranha biota do período Vendiano, cujos fósseis tem sido encontrados em camadas geológicas mais antigas do que o período que se considerava o mais recuado possível para a existência da vida multicelular. Alguns cientistas acreditam que pelo menos certos tipos de criaturas dessa época não apresentavam estrutura celular como a conhecemos, embora tivessem tamanho macroscópico. Porém, esta é uma proposição altamente especulativa e por isso não iremos desenvolvê-la nesse momento. Portanto, vamos neste trabalho limitar nosso estudo às formas de vida mais sofisticadas que realmente conhecemos, ou seja, animais e plantas multicelulares.
Uma vez definidas as criaturas às quais nos referiremos, podermos avançar para a questão de como formas de vida se tornam inteligentes, afinal. Para isso, inicialmente precisamos observar como a vida, em si, evolui. Ao contrário do que muita gente pensa, a evolução das espécies ao longo da história de nosso planeta não foi uma seqüência contínua de mudanças das estruturas mais simples para as mais sofisticadas, seguindo um caminho inflexível que levou inexoravelmente ao surgimento dos seres humanos. O que na verdade se observa é o surgimento de variações totalmente fortuitas nas populações de cada espécie, originadas por recombinações genéticas ou mutações, enquanto o meio ambiente exerce pressões que favorecem ou prejudicam a sobrevivência e a reprodução de determinados indivíduos, que apresentam características mais adequadas a sua adaptação às condições ecológicas do momento. Isso pode levar tanto no caminho da maior complexidade, quanto no da simplificação, dependendo das relações ecológicas específicas dos indivíduos e populações das espécies sucessivas em seus habitats. Por exemplo, peixes podem ganhar membros, pulmões e evoluir para dinossauros e mamíferos, mas estes podem também perder seus membros e voltar a viver na água, como seus ancestrais. No entanto, algumas características básicas das linhagens evolutivas tendem a se manter por mais ou menos tempo, por terem importância adaptativa muito grande. Os peixes mantiveram e reforçaram seus ossos ao subir à terra firme, ictiossauros e golfinhos mantiveram seus pulmões ao retornar para a água. O ponto mais importante a manter em mente é que as variações e a evolução decorrente delas não seguem nenhum caminho pré-definido, sendo totalmente aleatórias.

Aspecto humanóide: cabeça, tronco e membros. Seria uma regra universal para vida inteligente? Por que?
Cada forma de vida hoje existente sobre a superfície terrestre é conseqüência de uma sucessão imprevisível de mudanças ao longo de milhares ou milhões de gerações, e qualquer alteração nas condições adaptativas, ou mesmo simples eventos aleatórios no meio do caminho, poderiam ter levado ao surgimento de outras criaturas completamente diferentes. Como disse certa vez o conhecido astrônomo Carl Sagan, “se apenas uma libélula não tivesse morrido nos pântanos do carbonífero, hoje a forma de vida dominante em nosso planeta poderia ter três metros de altura e seis dedos em cada mão.” (ou algo assim). Dessa maneira, imaginar como poderiam ser os indivíduos de uma civilização extraterrestre não impõe razão para partirmos desde o princípio da forma humanóide e acrescentarmos depois características estranhas apenas para diferenciá-los de nós. Este recurso é muito usado por roteiristas de filmes de ficção científica, por facilitar em muito a caracterização de atores humanos como personagens alienígenas, mas não faz sentido do ponto de vista estritamente científico. O correto é verificar todas as possíveis variações que possamos conceber para as formas de vida em geral, identificar as características que nos parecem necessárias para uma raça ser reconhecida como inteligente, e então extrapolar aquela forma de vida imaginada para um ser que englobe estes traços peculiares. Praticado desta forma, o exercício de imaginar inteligências extraterrestres pode levar a resultados bastante interessantes. Vamos começar, portanto, verificando quais seriam as características de alienígenas que poderíamos reconhecer como inteligentes.
O sistema nervoso e suas implicações - A primeira delas seria a capacidade de reagir ativamente a estímulos externos, o que significa a presença de complexos órgãos sensoriais e de algo equivalente a um sistema nervoso sofisticado. Em nosso planeta, a grande maioria das formas de vida que consideramos mais inteligentes e evoluídas concentra sua atividade neurológica em uma massa de células especializadas chamada cérebro, que está conectado diretamente aos diversos órgãos de sentidos como visão, olfato e audição, bem como aos músculos do corpo, permitindo assim a execução de movimentos coordenados. Seres como as plantas ou as esponjas do mar, que não possuem um sistema nervoso diferenciado, nem órgãos especializados dos sentidos, não parecem ser candidatos adequados para evoluir e formar uma civilização. Desta forma tendemos a imaginar os seres alienígenas como também dotados de cérebros complexos, do mesmo tipo dos nossos. Embora a existência das células nervosas em si pareça ser uma exigência inescapável, será um cérebro compacto a única forma de organização possível para garantir a execução de atividades mais elaboradas por parte destas células?
Pelo que conhecemos, a resposta é não. Existem exemplos de formas de vida terrestres que não possuem um cérebro organizado e mesmo assim reagem ao meio ambiente, se deslocam, reproduzem e até caçam, tão bem como quaisquer outros animais. Entre eles, podemos citar os celenterados (como medusas e anêmonas), os equinodermos (como ouriços e estrelas do mar). Essas criaturas são capazes de reagir a diversos estímulos externos com movimentos bem distintos e organizados, a ponto de possuírem hábitos predadores e a capacidade de capturar presas, em princípio, muito mais evoluídas, como crustáceos e peixes, mesmo com seus sistemas nervosos dispersos – para isso, muitas espécies contam com a ajuda de células venenosas. Apesar da maioria delas parecer possuir uma capacidade apenas limitada de ação, pelo menos algumas são capazes de percepção apurada, execução de deslocamentos complexos e movimentos surpreendentemente coordenados. Quem já teve a oportunidade de observar um ofiúro (parente da estrela do mar com braços serpentiformes) buscando alimento pôde surpreender-se com a agilidade e determinação desses seres descerebrados. Assim sendo, não é impossível imaginar que nas condições adequadas criaturas sem cérebros bem definidos possam evoluir até alcançar a inteligência e criar uma civilização. E seres assim obviamente não precisariam possuir um crânio para proteger seu cérebro inexistente, na verdade nem mesmo uma cabeça para contê-lo. Com isso, seus órgãos dos sentidos poderiam estar localizados em diversas partes do corpo, ao invés de se concentrarem praticamente todos na cabeça, como acontece conosco.
Uma argumentação que se pode imaginar contra sistemas nervosos dispersos em criaturas evoluídas diz respeito à aparente fragilidade de uma estrutura neurológica assim. Danos mais ou menos extensos em muitas regiões diferentes do corpo poderiam afetar o sistema nervoso, o que impediria a recuperação das criaturas que eventualmente se ferissem na luta pela sobrevivência. Mas este argumento parte do princípio de que as células nervosas de seres alienígenas teriam a mesma dificuldade de se regenerar que as nossas, o que não precisa ser necessariamente verdade. Diversas espécies de nosso mundo, incluindo o exemplo extremo de alguns vermes platelmintos (como as planárias) podem regenerar grandes partes de seu corpo, incluindo aí suas células nervosas. É até possível que em nós, vertebrados, as células nervosas, principalmente as cerebrais, tenham perdido sua capacidade de reprodução justamente por estarem protegidas dentro de uma carapaça cranial. Talvez nesse aspecto, em termos cósmicos, nós sejamos a exceção e não a regra.
No outro extremo, também não existem garantias de que, caso criaturas inteligentes possuam cérebros, elas tenham que ter apenas um, como acontece conosco. Na era Mesozóica, em nosso próprio planeta, animais como o estegossauro possuíam um grande gânglio neural colocado na parte posterior do corpo, muito maior que seu próprio cérebro e supostamente responsável pela coordenação dos movimentos de suas pernas traseiras e cauda. Mais à frente, discutiremos outras criaturas bem atuais que também parecem funcionar assim. Pode-se, então, imaginar seres inteligentes com diversos “cérebros” distribuídos pelo corpo, desempenhando funções específicas. As variações possíveis vão muito além das duas cabeças gêmeas de alguns personagens da ficção científica.

Seria imprescindível a conformação e compartimentalização do cérebro conforme ocorre conosco?

A questão da simetria - O próximo ponto a analisar diz respeito às formas de simetria corporal. Nosso corpo possui o que chamamos de simetria bilateral, o que significa que temos um lado do corpo igual ao outro (ou pelo menos tende a ser mais ou menos igual). Mas novamente, temos exemplos de animais como estrelas-do-mar e pólipos de coral, que apresentam simetria radial e parecem conviver muito bem com isso. Não é realmente difícil imaginar que criaturas deste tipo pudessem ter se tornado dominantes na fauna de um mundo qualquer e gerado espécies avançadas com o mesmo tipo de simetria. Tais seres poderiam se deslocar deslizando sobre o substrato, como anêmonas, utilizar miríades de pequenas pernas, como e estrelas-do-mar, ou ainda andar sobre certo número de pernas fortes de movimento sincronizado, que sustentariam seus corpos longe do solo. Seus órgãos dos sentidos poderiam se distribuir uniformemente ao longo da circunferência, fazendo com que conceitos como “frente” e “trás” fossem estranhos para eles. É interessante imaginar como poderia ser a arquitetura e a engenharia de criaturas assim.
A simetria poderia ainda ser dorso-ventral ao invés de bilateral, como no grupo de animais conhecidos como braquiópodes, dos nossos mares. Seres assim poderiam ter um aspecto vermiforme, ou talvez se deslocar com movimentos de natação (ou de vôo) em mundos com atmosfera muito mais densa do que a nossa. Mesmo alguma forma de assimetria parcial poderia ser encontrada em formas de vida inteligentes que evoluíssem em outros planetas, do tipo que ocorre, por exemplo, nos pequenos caranguejos de mangue, que têm uma garra muito maior que a outra. Nós mesmos apresentamos certo grau de assimetria interna, pois alguns de nossos órgãos estão inclinados ou são colocados em apenas um dos lados do corpo. Apenas a total não-simetria parece ser incompatível com organismos mais evoluídos, ocorrendo em nosso planeta apenas em alguns tipos de poríferos (esponjas marinhas) menos desenvolvidos. No mínimo, uma falta total de simetria iria prejudicar o deslocamento em linha reta de um animal que a possuísse, e isto pode ser um impedimento para que uma forma de vida assim evolua.
Estruturas corporais - Quanto à estrutura de sustentação, que dá a forma e o aspecto geral do corpo, os requisitos para o desenvolvimento de espécies inteligentes aparentam ser mais restritos. No caso de orbes como o mesmo nível de gravidade superficial e densidade atmosférica que o nosso, nem todos os tipos de estruturas parecem adequados para o desenvolvimento de organismos complexos o suficiente para poderem desenvolver um nível avançado de inteligência. Por exemplo, em nosso mundo atual, os artrópodes terrestres (insetos, aracnídeos, miriápodes etc), que ao invés de um esqueleto interno possuem um exoesqueleto semelhante a uma armadura, formado por placas quitinosas do lado de fora do corpo, apresentam limitações severas quanto ao tamanho que podem atingir. Os maiores espécimes hoje existentes desses animais não passam de algumas dezenas de centímetros de tamanho e, devido à limitações mecânicas e respiratórias, eles não podem atingir tamanhos muito maiores. Portanto, as raças insetóides, de forma e tamanho próximas à humana, comuns na ficção científica (geralmente fazendo papel de vilões), não são muito prováveis, já que, em princípio, um sistema nervoso sofisticado o bastante para gerar o nosso nível de inteligência demandaria um corpo maior. No entanto, as limitações citadas acima se aplicam a cada segmento individual do corpo dos artrópodes, e não ao seu tamanho total. Um inseto com um abdômen ou tórax tão grandes quanto os de um homem seria extremamente frágil e, dificilmente, poderia se sustentar contra a gravidade de um planeta como a Terra, mas se seu corpo fosse composto de vários segmentos menores, então as restrições mecânicas não se aplicariam. O mesmo se dá com relação à respiração traqueal destes animais – não pulmonar, devido ao exoesqueleto rígido, o que causaria dificuldades em fazer seus pulmões se distenderem –, que tem pouca eficiência para uma atmosfera com o teor de oxigênio da nossa, mas poderia funcionar em um mundo com uma proporção maior de oxigênio.
Isso já aconteceu no passado, quando o oxigênio era mais abundante e viveram aqui seres como a libélula gigante Meganeura, com oitenta centímetros de envergadura, ou o enorme miriápode Arthropleura, similar a uma centopéia com mais de dois metros de comprimento e 50 kg de peso, maior do que muitos seres humanos inegavelmente inteligentes. Então, em princípio, nada impede que criaturas desse tipo alcancem a inteligência também, embora em nosso planeta os miriápodes não pareçam ser os artrópodes mais inteligentes e, sim, os insetos e aracnídeos. Fica aberta a questão do que poderia existir em mundos com gravidade menor que a nossa. Outra forma de estrutura que por aqui permitiu o desenvolvimento de um nível de inteligência admirável foi a dos moluscos cefalópodes. Animais como os polvos já mostraram em testes de laboratório possuírem um nível de inteligência perfeitamente comparável ao de mamíferos como os cães. Existem parentes do polvo muito maiores nos oceanos, como a lula gigante, com cérebros igualmente proporcionais. Em nosso próprio mundo essas criaturas jamais abandonaram as águas e talvez por isso não tiveram a mesma chance dos animais terrestres de evoluir e criar uma civilização.
No entanto, isso não parece ser um impedimento absoluto. Seus parentes moluscos gastrópodes (lesmas e caracóis) fizeram uma passagem bem sucedida para o ambiente terrestre e pode ser perfeitamente possível que, em outros mundos, criaturas similares aos cefalópodes tenham sido bem sucedidas neste aspecto também. É muito difícil imaginar o que uma linha evolutiva como esta poderia gerar em termos de espécies e indivíduos inteligentes, da mesma forma que a aparência de um primitivo peixe pulmonado não permite visualizar a subseqüente forma humana. Todavia, a primeira coisa que vem à mente é uma enorme lesma com olhos pedunculares e longos tentáculos, talvez com as pontas bifurcadas para facilitar a manipulação de objetos. Mesmo se nos limitarmos às formas vertebradas, que em nosso mundo foram as mais bem sucedidas no domínio dos ambientes terrestres, nada garante que elas tivessem a mesma estrutura básica dos serem humanos, com nossa forma bípede ereta, dois braços e uma cabeça. Somos assim porque em nosso mundo o ancestral comum de todos os vertebrados terrestres, um membro de uma ordem de peixes chamada de crossopterígios, era uma criatura com quatro barbatanas laterais – que deram origem às quatro pernas dos primeiros animais terrestres -, um tronco único e cabeça distinta, colocada na ponta da coluna vertebral. Mas nada garante que esta seja a única forma possível. Pode-se perfeitamente imaginar que o número de barbatanas laterais nesses espécimes fosse maior, o que seria perfeitamente funcional para um peixe e poderia levar a toda uma linha de vertebrados de seis, oito ou mais pernas, algumas das quais poderiam depois evoluir para braços ou asas.
Da mesma forma, a cabeça poderia ter-se mantido fundida ao resto do corpo, ou existir mais de uma (já mencionado anteriormente). Todas estas formas são fisiologicamente viáveis e, portanto, pode-se imaginar criaturas inteligentes vertebradas com formas muito diferentes não apenas da humana, mas também de qualquer outro animal vertebrado já surgido em nosso planeta. Um exemplo clássico seriam as formas centauróides, com dois braços, quatro pernas e corpos formando a letra “L”, como os centauros da mitologia grega (daí o seu nome), que também não são raras na ficção científica, mas muitas outras possibilidades podem ser imaginadas.

Típico exemplo de cefalópode, o polvo apresenta macroneurônios, ligados à inteligência. Poderiam, em circunstâncias favoráveis, desenvolver uma civilização?
Apêndices manipuladores - Mais um importante aspecto a considerar para que uma raça inteligente possa desenvolver o que chamamos de civilização, é a capacidade de criar e manipular objetos e ferramentas. Muitas espécies aqui na Terra mostraram poder utilizar pedras, galhos e mesmo partes de outros animais como ferramentas para executar tarefas específicas. Formigas podem utilizar folhas para construir seus ninhos, pássaros utilizam espinhos para fisgar larvas de troncos e golfinhos já foram vistos empregando peixes venenosos para capturar perigosas moréias. No entanto, as capacidades de manipulação destes animais são muito restritas, pois lhes faltam apêndices manipuladores mais sofisticados e eles são obrigados a utilizar suas bocas para segurar e empregar estas ferramentas. Assim é quase impossível manipular dois objetos ao mesmo tempo e, desta forma, na prática torna-se inviável a produção de objetos complexos, gerando os sistemas mais sofisticados que caracterizariam uma raça civilizada. Sem eles, não é possível que uma espécie, mesmo que inteligente (como exemplo, alguns acreditam que os golfinhos e/ou baleias sejam), possa criar uma civilização.
Portanto, uma característica que uma raça civilizada extraterrestre precisaria, com quase toda certeza, apresentar, seria a posse de apêndices manipuladores. Nossas mãos são excelentes exemplos desse tipo de apêndices, mas de forma alguma o único concebível. Em diversas espécies de crustáceos, como lagostas e camarões, observa-se a presença de quatro ou 6 pares de pinças articuladas, capazes de trabalhar em conjunto para segurar o alimento que buscam no fundo de mares e rios. Embora cada garra isoladamente seja menos eficiente que uma mão humana, pela falta de um polegar opositor, um conjunto de quatro ou 6, como possuem, poderia ser igualmente eficiente, bastando um sistema nervoso mais desenvolvido para comandá-las. Outra possibilidade é o uso de tentáculos não articulados, como os dos já citados cefalópodes. De fato, polvos e lulas já demonstraram em testes excelente capacidade de manipulação de objetos, existindo relatos de exemplares desses animais em aquários desmontando válvulas ou empilhando pedras para formar barreiras. A coordenação precisa dos movimentos de um grande número de tentáculos tão flexíveis quanto os dos cefalópodes pode parecer uma tarefa quase impossível, mesmo para um cérebro avançado como o nosso, mas pesquisas recentes indicam a possibilidade de que, pelo menos nos polvos, grande parte do controle de cada tentáculo seja efetuado pelo sistema nervoso contido nele próprio, o que simplificaria a tarefa para o cérebro central. Existe até mesmo um gânglio nervoso colocado na base de cada ventosa, permitindo controlá-las individualmente.
Contando com um sistema assim, conforme já mencionado anteriormente, não é tão complicado imaginar criaturas semelhantes a polvos evoluindo para uma raça inteligente e criando uma verdadeira civilização. Em nosso planeta, contudo, parece difícil que venha a acontecer, por dois motivos: primeiro, os cefalópodes daqui vivem por um tempo bem curto, apenas um ou dois anos e praticamente não existe convívio entre as gerações. Desta forma as capacidades de aprendizado transmitido, que são comuns em mamíferos e aves, não podem se desenvolver. E segundo, porque em ambientes aquáticos não é possível utilizar o fogo, que pode ter sido um avanço importante para o desenvolvimento da inteligência superior dos seres humanos. Mas quem sabe em outros planetas, com outras seqüências evolutivas? Existe pelo menos um relato de um polvo mantido em um aquário público que saía de seu tanque, deslocava-se até outro vizinho, comia peixes mantidos ali e, depois, voltava para sua “casa”. O que poderia acontecer se, ao longo das eras descendentes deste esperto cefalópode, se adaptassem a viver cada vez mais tempo fora d`água?
Braços, mãos, pinças e tentáculos não esgotam as possibilidades de órgãos capazes de manipulação. A tromba dos elefantes também é capaz de exercer este papel, apresentando em sua ponta uma capacidade de tato e apreensão suficiente para que os paquidermes arranquem tufos de plantas e os utilizem para espantar moscas, ou recolham delicadamente frutos macios em árvores elevadas e os levem até a boca sem lhes romper a casca. Se, ao invés de uma, os elefantes tivessem desenvolvido duas trombas – e nada impede que uma mutação cause este tipo de mudança, já que até mesmo animais com duas cabeças não são de todo incomuns –, eles teriam uma capacidade de manipulação bem próxima da humana. Considerando a possibilidade de evolução posterior, é fácil imaginar uma civilização avançada surgindo daí, como fizeram os o autores de ficção científica Larry Niven e Jerry Pournelle, em seu romance “Invasão”, onde uma raça dotada de trombas, que se subdividiam sucessivamente até possuir oito pontas distintas, atacava nosso planeta.
Conclusão - Considerando tudo o que foi exposto acima, fica evidente que imaginar a forma humanóide como a única ou mesmo a mais freqüente que poderia ser assumida por seres extraterrestres inteligentes é, no mínimo, um exercício de arrogância, em que imaginamos o universo à nossa própria imagem. Ainda que levemos em conta apenas o que conhecemos sobre a vida em nosso próprio planeta, é perfeitamente possível imaginar diversas formas físicas totalmente diferentes da nossa e, pelo menos, tão adequadas quanto ela ao desenvolvimento de um nível de inteligência superior e à criação de uma verdadeira civilização. Se lembrarmos ainda que, ao pesquisar o cosmos nas últimas décadas, acabamos descobrindo objetos e fenômenos totalmente distintos daqueles encontrados aqui embaixo, os quais nos eram totalmente insuspeitados anteriormente, como estrelas pulsantes, buracos negros, matéria escura e planetas gigantes ferventes, então podemos esperar que, além daquilo que podemos conceber neste momento, muitas outras possibilidades devem ser admitidas. E nossos irmãos inteligentes de outros sistemas solares podem ser criaturas que nosso intelecto não poderia nem mesmo imaginar.
É claro que pode haver motivos absolutamente desconhecidos que obriguem o surgimento apenas de civilizações compostas por humanóides nas miríades de mundos habitados que devem existir pelo universo. Talvez os místicos Campos Mórficos propostos pelo cientista britânico Rupert Sheldrake forcem a evolução apenas de corpos semelhantes aos nossos, ou quem sabe Deus teria uma predileção toda especial pela nossa forma específica. Mas aí já teríamos que entrar em outros campos que não o puramente científico e este não é o escopo deste artigo. Limitando nosso raciocínio ao que a ciência conhece atualmente e extrapolando a partir daí, a conclusão a que se chega é que a forma humana é, provavelmente, apenas mais uma entre as muitas possibilidades de desenvolvimento de formas de vida inteligentes que devem ocorrer em outros orbes.

Diversidade sem limites ortodoxos, esta parece ser uma das trilhas para investigação no século XXI

Da mesma forma que nossa psicologia, nossa estrutura social e mesmo nossos conceitos morais, são, em grande parte, ditados por nossa fisiologia e a forma de nosso corpo, outras civilizações no espaço, compostas por seres que possuíssem corpos fundamentalmente diferentes da forma humanóide, poderiam ter também desenvolvido padrões pensantes e comportamento muito distintos, não necessariamente coadunáveis aos nossos. Isso nos força a pensar então nas enormes dificuldades que temos em conviver com outros grupos perfeitamente humanos existentes em nosso planeta, e que se diferenciam apenas por usar uma língua diferente, ter a pele diferente ou acreditar em uma teologia um pouco distinta da nossa, e surge a inevitável pergunta: estaríamos realmente prontos a travar contato com outras raças, absolutamente inumanas que, porventura, viéssemos a contatar por rádio, ou que viessem nos visitar em avançadas naves espaciais? Seria o 
Homo sapiens realmente capaz de dialogar amigavelmente com esses “semelhantes”, que nos pareceriam monstros incompreensíveis?
Autor: Leandro G. Cardoso
Fonte: Recanto das Letras
Crédito da foto: Arquivo UFO/Hubble/Wikipédia/Cristian Soldano et al

Um comentário:

  1. Os animais evoluem muito, a pouco tempo encontraram no Equador mais de 30 espécies de anfíbios, sendo que algumas ras depositam ovos em arvores e nao na agua.

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Olá, receba as boas vindas e um abraço.
Marcia

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